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AGORA MESMO POR FOLHAPRESS
BRASIL INTERIOR
De norte a sul, cidades do interior do país viram seus sistemas de saúde colapsarem no começo deste ano em meio à segunda onda da Covid-19,
"Hoje é que eu tô vendo o que é Covid. Comparado a isso, ano passado a gente não tinha nada, não. E não sabemos quando vai parar. É como se a gente estivesse com os olhos vendados partindo para uma guerra, sem saber o que o inimigo pode fazer".
É assim que o prefeito Isaú Fonseca (MDB), da cidade rondonense de Ji-Paraná, no meio da Amazônia, define a situação da pandemia que esgotou o sistema hospitalar da região.
A mais de 3.000 km dali, na outra ponta do país, o prefeito Jorge Pozzobom (PSDB), de Santa Maria (RS), usa expressão parecida. "É um inimigo invisível e traiçoeiro, que está agora muito mais fortalecido", diz ele, na cidade onde há mais internados do que leitos de UTI.
De norte a sul, cidades do interior do país viram seus sistemas de saúde colapsarem no começo deste ano em meio à segunda onda da Covid-19, em muitos casos muito mais devastadora do que a primeira.
Sem recursos, sem vacinas, sem vagas, sem oxigênio e agora até sem remédios, prefeitos por conta própria impõem restrições e fecham suas cidades –e são cobrados por isso.
É o caso de Patos de Minas, a 400 km de Belo Horizonte. Nos piores momentos da pandemia no ano passado, em julho e dezembro, a cidade, de cerca de 153 mil habitantes, tinha 40 novos casos confirmados da Covid-19 por dia, em média. Fora desses dois momentos, raras vezes essa taxa passou de 20.
Nesse intervalo, venceu a eleição Luís Eduardo Falcão (Podemos), presidente de uma associação comercial e então contrário às medidas de fechamento da cidade. Ele próprio havia se tratado com cloroquina, remédio considerado ineficaz para a Covid-19, em outubro. "Achei que deveria usar todas as armas e naquele momento entendi que não havia tanta certeza sobre a eficácia ou não", diz.
Já na cadeira de prefeito, viu disparar o número de casos e a média diária chegar a 300 em fevereiro. E a região inteira entrou em colapso, e cidades como Coromandel e Carmo do Paranaíba precisaram pedir socorro ao Corpo de Bombeiros para remover pacientes de helicóptero para cidades distantes que ainda tinham vagas.
É o caso também de Uberlândia, onde só neste mês de março já morreram mais de 400 pessoas com a doença.
No meio de fevereiro, Falcão impôs toque de recolher noturno e fechamento de comércios. Em março, veio decreto do governo Romeu Zema (Novo), com mais isolamento em toda a região.
A conta chegou para o prefeito, que foi cobrado por comerciantes. Vídeo de um jornal local mostra os manifestantes pedindo que, para permitir a reabertura, a prefeitura imponha um protocolo de "tratamento precoce" contra a Covid, conjunto de medicamentos sem eficácia comprovada para a doença.
De um mega-fone, o prefeito, que se tratou com cloroquina, grita aos manifestantes: "85% das pessoas chupando laranja ou tomando água vão se curar do vírus", sob críticas dos conterrâneos.
À Folha de S.Paulo, ele explica a mudança de posicionamento. "No hospital vejo gente que tomou esses medicamentos se agravarem, irem para a UTI, até morrerem. Milagre não é. Quem quiser tomar, fique à vontade, o médico tem liberdade para oferecer o que quiser. Agora, prefeito não receita medicamento", diz.
"Entendo os comerciantes, não é justo mesmo penalizá-los. E as pessoas procuram um culpado e uma solução. O culpado é o prefeito e a solução é a cloroquina. Mas não é. O culpado é o vírus e a solução é a vacina", resume.
O fechamento é a medida mais urgente em regiões onde a situação é grave para dar um alívio ao sistema de saúde, diz a epidemiologista Ana Luiza Bierrenbach, assessora técnica da organização internacional Vital Strategies.
Cidades do interior podem esgotar antes das capitais porque o limite do sistema por vezes é mais rígido, diz ela. "A cidade tem 10, 20 leitos, e é isso, não tem espaço para aumentar, não tem para quem recorrer. E quando é uma referência regional, recebe pacientes de cidades vizinhas e colapsa", afirma.
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